segunda-feira, fevereiro 20, 2006

28) O maior tocador de pandeiros do Brasil

Alguma coisa que se faz pode trazer conseqüências que trazem reflexos durante a vida toda. Um ato impensado, uma brincadeira, alguma coisa involuntária... qualquer coisa pode, de uma forma ou de outra, transformar-se, com um pouco de azar, em problemas, doenças ou, se a sorte for boa, em motivo de sucesso.

Assim também é o nome que se escolhe para os filhos. O nome marca a pessoa pela vida toda. Só que em Tatuí não adianta a escolha dos pais, o que resolve mesmo é o apelido com que será “batizado”. Aí não resolve nada o nome ser bonito, feio, comum ou exótico. O que vale é o apelido.

Algumas pessoas têm nomes que já parecem apelido, mas mesmo assim não ficam livres do rebatismo: lembro-me do Hermógenes... um nome incomum, rebatizado para Mauzico e, posteriormente, para Meninão. Os exemplos são infindáveis.

Joaquim Mistura recebeu seu apelido devido a um pequeno deslize que cometeu na adolescência.

Sua mãe não tinha renda suficiente e, com isto, fez com que o menino Joaquim trabalhasse para ajudar nas despesas. Creio que trabalhou bastante e “gastou a pilha”, porque nunca mais exerceu atividades produtivas... sua única e exclusiva atividade era tocar pandeiro. E beber, claro!

O emprego que arrumaram para o Joaquim era de entregador de marmitas de uma pensão da cidade. As pessoas comem de pensão devido a inúmeros motivos, sendo que a falta de tempo e a impossibilidade de cozinhar podem ser citados como uma das razões.

Se é uma comodidade comprar a comida pronta, ter que ir buscar a marmita não é uma atividade agradável e, em muitos casos, nem mesmo dá para ir buscar... pessoas idosas, crianças, gente com horários apertados...
Marmitas entregues e saqueadas pelo Joaquim Mistura

Sendo assim, é comum existir “entregadores profissionais de marmita”. Que bela profissão!!!

Joaquim desde criança era malandro. Fazia as entregas, mas distraia-se com facilidade... qualquer jogo de bolinha de gude, uma movimentação diferente na rua, chuva, sol... tudo era motivo para Joaquim demorar-se mais que o previsto.

E tinha um apetite monstruoso. Comia até pedregulho, se fosse possível. E a carga das marmitas exercia uma atração no menino. Adorava carne, almôndegas, croquetes, bolinhos, etc.

Sendo assim, na primeira esquina que virava, quando trabalhava para a pensão, dava um jeitinho e levantava as marmitas para espiar o conteúdo. Olhava de um lado e de outro e surrupiava um bolinho, um pedaço de carne de cada marmita... assim ninguém percebia e reclamava... ele continuaria com seu pequeno delito.

Mas algumas pessoas perceberam a atividade criminosa do Joaquim. Quando viram o Joaquim carregando as marmitas, alguém apontou e disse: “Olha só, o Joaquim roubando “mistura” das marmitas!”

É costume chamar de mistura à carne e aos bolinhos que são servidos com o arroz e o feijão (estes considerados como “comida”).

Pronto! Perceberam o que o Joaquim fazia e logo perdeu seu emprego. Perdeu o emprego, mas ganhou um belo apelido "Joaquim Mistura" que o acompanhou a vida inteira. Ninguém lembra seu nome, só seu apelido. Nem mesmo ele atende pelo nome, Joaquim Soares Carriel... seu nome é Joaquim Mistura e só!

Instrumento que Joaquim Mistura sempre tocou

Joaquim explorou sua veia musical. É o maior tocador de pandeiros que já existiu em Tatuí. Ele é o “Grande Joaquim Mistura” e tocou até mesmo na Radio Nacional do Rio de Janeiro, nos tempos áureos dessa emissora.

Auditório da Rádio Nacional (Rio de Janeiro)

É até mesmo possível considerar a carreira musical do Joaquim Mistura como de grande sucesso, haja vista que só fez isso na vida e nunca mais trabalhou além daquele pequeno período, quando roubava misturas. Foi, em decorrência de sua atividade musical, convidado para todas as festas que aconteceram em Tatuí desde o final da década de 1940 até uns poucos anos atrás.

Joaquim apreciava todo tipo de bebida

Como músico esteve em todo tipo de ambiente: bons e maus, certos e errados, claros e escuros... só não freqüentou igrejas! Vivia em bares, sempre foi apreciador de licores, pinga, vinho, wiskey, chopp, cerveja, conhaque, vodka, rum... tudo, gostava de tudo que tivesse álcool.

Tocador de pandeiros tem de ter ritmo

Agora a "mistura" preferida do Joaquim não era mais aquela antiga... sua "mistura" tinha que ser rabo de galo... pinga com limão... pinga com soda... rum com Coca-Cola... gim com tônica... vodka com laranjada e assim por diante

Segurando na parede Joaquim não cai (foto de julho de 2008)

Esta é a história do grande Joaquim Mistura, o maior tocador de pandeiros do Brasil.

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