sexta-feira, fevereiro 10, 2006

25) Queimando campos tatuianos

Quando Cornélio Pires contou as Estrambóticas Aventuras de Joaquim Bentinho, um caboclo mentiroso, autor do famoso “queimar campo”, não imaginava que em Tatuí, muitos anos depois disso, alguns tatuianos fariam o “queimador de campo” Joaquim Bentinho ficar corado de vergonha, tão grandes foram suas barbaridades.

Vou contar aqui algumas pequenas “queimadas de campo” de tatuianos campeões, enterrando de vez o tal Bentinho.

O próprio Barão de Münchausen foi suplantado por alguns tatuianos

CASO 1

O irmão do Chuvisco ia de vez em quando na madeireira de seu pai, ali na rua Santa Cruz. Ele passava por lá para pegar um dinheirinho, mas nunca para trabalhar. Só que em uma ocasião fez os empregados da carpintaria trabalharem em uma estranha encomenda: aparelhar umas madeiras enquanto falava ao telefone!

É preciso lembrar que nessa época o telefone funcionava precariamente, precisando da telefonista para qualquer ligação. Um interurbano, por mais perto que fosse, sempre tinha espera: minutos ou até mesmo horas.


O telefone não era automático, precisava do auxílio de uma telefonista


Do escritório da madeireira ligou para a namorada, que residia em outra cidade. Esperou quase uma hora para a telefonista conseguir a ligação. Ufa! Enfim conseguiu! Enquanto falava com ela, a um sinal combinado, os empregados da madeireira ligaram algumas máquinas da carpintaria. Ficava um pouco distante, mas o ruído era perfeitamente audível ao telefone.

Desengrossadeira e desempenadeira

Na desengrossadeira colocaram uma tábua para aparelhar... fazia um barulho quase que constante RRRRRRUUUMMMM.
Outros começaram a passar uma viga na desempenadeira, que roncava UÓÓÓÓMMMM! UÓÓÓÓMMMM! UÓÓÓÓÒÒÒÒÒÒMMMM!

Ele dizia à moça:

- Benhê, estou treinando aqui em Interlagos. Vou correr domingo com a minha "carretera"! – enquanto a “trilha sonora” roncava ao fundo.

À distância parecia mesmo que eram motores roncando. A mudança de espessura da tábua na desengrossadeira alterava constantemente a intensidade do som, parecendo mesmo motores sendo acelerados e desacelerados RRRROOOOOMMMM... RRRROOOOOMMMM... enquanto que o som da desempenadeira era semelhante a passagem de um carro em velocidade. UÓÓÓÓMMMM! UÓÓÓÓMMMM! UÓÓÓÓMMMM!

Carretera igual aquela que Peninha dizia pilotar


Sabe-se que ele conseguiu enganar a namorada. Não sei o que ele fez depois para dizer que não corria mais em Interlagos... ou nem se chegou a desmentir. Só que, se alguém tiver alguma dúvida, pode procurar nos registros de Interlagos... Ninguém conhece o tal "piloto"! Mas a vizinhança pode ter ficado aborrecida... o cara fez funcionar serra circular, plaina, desempenadeira, furadeira, tupia... um barulhão imenso!!! Só para dar "credibilidade" em seu papo! Poderiam ter aproveitado e feito alguma coisa útil com a madeira destruída...

CASO 2

Certa noite estávamos jogando baralho a “leite de pato” (a Cr$ 1,00) na minha casa. Fiquei com dor de cabeça e resolvi deitar em meu quarto, esperando que a danada passasse logo.

Enquanto isso, uma pessoa folclórica que estava por lá, veio para dentro de casa e começou a conversar com minha mãe.

Nessa noite ele estava inspirado. Inspirado e espiritualista. Tanto é que lembrou dos votos que teve na eleição para vereador, quando ficou classificado como o primeiro suplente do MDB (Movimento Democrático Brasileiro), partido de oposição ao governo militar:

- Eu tive um sonho, uma semana antes da eleição. Uma pessoa apareceu e disse, em voz alta: "Nesta eleição você está ligado a Cristo!".

- Acordei e levantei assustado. - continuou contando seu sonho. - Comecei a pensar: a única coisa que sei de Cristo é que ele morreu com 33 anos!!!! Será que terei apenas 33 votos?

- Tive 337 votos! Trinta e três da idade de Cristo e sete dos dias da semana que faltava para a eleição no momento do sonho!

Eu estava escutado tudo deitado em minha cama e comecei a rir. Os 337 votos foram reais, só o sonho era mentira.

Mas a inspiração dele não deixou ficar só nisso. Começou a contar uma outra “queimada de campo”, imaginando, decerto, que minha mãe estava acreditando em tudo:

- Eu fui a uma vidente em Campinas, que teve uma visão de uma de minhas vidas passadas: eu era um príncipe hindu. Usava um turbante com um rubi enorme na frente. E eu fui um príncipe muito adiantado para a época, por isso é que tenho estas idéias avançadas.

Ele em outra encarnação, como príncipe hindú

Aiaiaiaí! Eu querendo dormir e ele ali, contando essas “verdades”! E pior, não ficou só nessas duas:

Ainda conversando com minha mãe, contou que ele conseguia transportar-se em pensamento. Explicou que gostava muito de festas e que, se algumas vezes não conseguia ir à determinada festa, ele se transportava até lá. Até hoje adora festas, mas nunca é convidado e, assim, dá um jeito de "aparecer lá dentro"!!!

Fazia uma preparação espiritual, deitava-se, concentrava-se e, alguns minutos depois, dormia. Logo em seguida saía de seu corpo, numa viagem astral totalmente voluntária, completamente controlada por ele próprio.


Sua viagem astral era semelhante a um sonho tão intenso que, no dia seguinte, ao encontrar com as pessoas que viu nesse sonho, estas lhe diziam que o viram por lá também.

- Lembro das bebidas que tomei no sonho, do que comi... - afirmou.

Minha mãe nem sabia o que dizer a respeito daquilo e, então, perguntou:

- Mas você não acorda de ressaca?

- Quando misturo bebidas no sonho, acordo de ressaca! – respondeu imediatamente.

Agora ele havia superado a si mesmo!!!! E, claro, superou ao pobre do Joaquim Bentinho, que apenas queimou o campo.

CASO 3

Havia em Tatuí um famoso corretor. Teve muito sucesso em suas atividades, mas sempre primou por enfeitar as coisas um pouco mais que o necessário. Gostava de sentir-se admirado. Neste diálogo que ele teve com o Serginho, outro corretor, dá para perceber sua mania de melhorar as coisas que fazia ou que tinha:

- Você sumiu! Que andou fazendo? Onde estava? - perguntou um amigo.

-Estava no Rio de Janeiro, numa casa com vista para Ipanema! disse na maior cara de pau - Pode ficar com inveja! - completou cheio de si.

O que não explicou é que o Rio de Janeiro que falava era, na verdade, a rua Rio de Janeiro, ali na Vila Santa Luzia, onde andou escondido de alguns credores, e a Ipanema que via nada mais era que o morro de Ipanema, pertinho de Araçoiaba da Serra.

Entretanto, sua afirmação teve o efeito esperado, pois seu amigo piamente. Ficou pensando com seus botões que, com o que ganhasse na primeira boa corretagem iria também ao Rio de Janeiro. Não sabia que o “Rio” dele estava aqui tão perto...

Suas histórias foram inúmeras.

Uma delas contou ao Euchário Holtz em uma tarde. Nessa noite Euchário faleceu. Não sei se isto teve alguma influência, pois era sabido que o filósofo não tinha paciência para escutar esse tipo de conversa.
Operadores da Torre de Controle do Aeroporto de NY ficaram admirados com a autonomia e a velocidade do jatinho em que Helio viajou

Contou que, na semana anterior, tinha ido ao Mato Grosso vender uma fazenda a um figurão de São Paulo. Foram no jatinho desse cliente. Aqui está a história que contou:

- Fomos de jatinho até o Mato Grosso. Sobrevoamos a propriedade, verificando todos os pontos, as divisas, os rios, as estradas, a topografia... – explicou ao Euchário.

- O cliente gostou da propriedade e ali mesmo no avião fechamos o negócio. – completou.

- Quando voltávamos – continuou - o cliente perguntou se eu não estava com fome:

- Vamos almoçar?

- Vamos! Onde? – perguntou.

- Vamos almoçar ali em Nova Iorque! É rapidinho até lá!

Nesse momento Euchário calou-se. Ficou pensando nas horas de viagem entre Mato Grosso e os Estados Unidos. Nova Iorque fica longe de Miami, imagine só de Campo Grande. Um jatinho, com toda certeza, não teria nem autonomia para tal viagem. Mas buscou um pouco de paciência para não ter que se levantar do banco.

- Quando o avião saiu do território nacional eu contei que sabia pilotar aviões. No mesmo momento ofereceram-me para que eu conduzisse o jato. Assumi o lugar do piloto e fui conduzindo até Nova Iorque. Para descer o avião eu cedi novamente meu lugar para o piloto. Não quis assustar o pessoal, mas com certeza conseguiria pousar. – explicou tintim por tintim sua viagem ao Euchário, que estava prestes a explodir.

- Descemos em Nova Iorque e fomos almoçar. Uma bela refeição! – disse Helio.

Restaurante em NY, onde o grande corretor afirmou ter ido

Quando ia contar o menu, Euchário não agüentou mais e perguntou:

- E o passaporte?

- Não precisava, porque o chefe da Alfândega de Nova Iorque é meu amigo! – finalizou.

Foi o que bastou. Euchário levantou-se e foi embora resmungando:

- Ô mardição! Que falta faz um armamento!!!

Não agüentou mais ouvir aquilo.

Infelizmente foi nessa mesma noite que faleceu. Seus comentários estão fazendo falta com o FEBEAPA - Festival de Besteiras que Assola o País (expressão criada por Stalislaw Ponte-Preta).

E daí, Joaquim Bentinho? O campo ainda está queimando?

Mas o tal corretor continuou a contar suas aventuras até fins de 2004, ano em que faleceu. Costumava dizer que a primeira vez que viajou ao exterior foi na guerra, quando era cozinheiro da FEB (Força Expedicionária Brasileira), um fato ainda sem confirmação.

A maior das "aventuras" dele continua a provocar controvérsias. Não porque alguém possa questionar a veracidade, mas porque um outro tatuiano afirma ter estado presente nesse evento, entretanto, não admite que os dois se encontraram.

O evento?

Simplesmente disse que foi convidado pela Força Aérea dos Estados Unidos (USAF) para ser um “observador” do governo brasileiro no lançamento da bomba atômica em Hiroshima. Isso mesmo que você está lendo, no Enola Gay, havia um ou até mesmo dois tatuianos, viajando com observadores, por ocasião do lançamento da bomba no Japão, no final da Segunda Guerra Mundial.


Tripulação do Enola Gay - infelizmente não aparecem os tatuianos


A controvérsia surgia quando se perguntaa um deles se havia mais um tatuiano presente. Ambos negavam. Isto ainda acontece quando se indaga à outra testemunha desse evento histórico a respeito da presença do outro tatuiano: essa pessoa fica imediatamente aborrecida e pára de narrar os acontecimentos.


Queimada de campo do Joaquim Bentinho e a fumaceira que os tatuianos afirmam ter feito em Hiroshima


As Estrambóticas Aventuras de Joaquim Bentinho não são coisa grande perto das "aventuras" deste tatuiano. Isto pode ser facilmente conferido pelo nível da fumaceira que provocaram.

Pela fumaça destas duas fotos dá para perceber que o "estrago" dos dois tatuianos foi superior à mera "queima de campo" do Joaquim Bentinho.

Quer mais? Pobre Joaquim Bentinho!!!

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