quinta-feira, janeiro 26, 2006

20) Joaquinzinho Meia Garrafa

Toda cidade do interior tem seus tipos populares. Tatuí sempre foi pródiga nesse aspecto: Conde Matarazzo – andava pelas ruas juntando gravetos; Kique – um dos mais fortes chapas que já apareceram na cidade e que foi bastante admirado, até que a bebida o consumisse (havia até um bordão: “O quê, Kique!”); Zé Duarte – Do iú espíque engriche? Ele aprendeu umas frases em inglês e, apesar de seu fedor horrível, tentava conquistar as estudantes do ginásio e normalistas: - Ái love íu!; Mazzaropi; Super-homem; Ringo; Maria Boneca; Cida Jacaré; Bolinha; João Botuca, Zé Pacuera...

Todos esses tipos populares tinham algum tipo de problema, agravado sempre pelo álcool. Dá para afirmar que, com o efeito do álcool, quase todo mundo vira palhaço, às vezes para o bem e às vezes para o mal.

O Joaquim “Meia Garrafa” é um dos que conseguiram abandonar o alcoolismo. Já faz mais de 20 anos que ele deixou de beber e leva uma boa vida, trabalhando e vivendo de seu trabalho.

Mas deixou histórias!!!! E como!!!

Pequenino, cara de caipira, um verdadeiro "mini capiau", mas dono de uma grande vivacidade. Ele mede, quando muito, 1,45m. Baixinho mesmo.

Na época em que bebia, nem precisava pagar. Acho que nunca pagou uma dose sequer, porque todos queriam sua companhia e lhe pagavam toda bebida que conseguisse beber.

Era muito divertido. Inventava casos e piadas. Tudo que ele dizia era engraçado. Costumava frequentar um determinado bar no Largo do Mercado, onde guardava sempre seu paletó pendurando em um prego que estava fixado na parede. Ficou uns dias sem aparecer (provalmente esteve preso) e, quando voltou ao bar, foi pendurar seu paletó. Mas haviam pintado as paredes e sumiu o tal prego. Ele comentou, engrossando sua voz:

- É só a gente sair de férias que mudam até o guarda-roupas! (GARGALHADA GERAL)

Era sempre assim, animava os bares onde ficava. Uma figura querida por todos.

Mas não era raro passar da conta e começar a fazer arruaças.

E, quando passava da conta, só havia uma solução: prender Joaquim Meia-Garrafa. No dia seguinte ele amanhecia sóbrio. Depois de tomar uma chuveirada de água fria na cadeia.

A cadeia de Tatuí, até o início da década de 70, era “risonha e franca”! Dá para dizer que, em comparação com a atual, era um luxo! As celas tinha assoalho e forro de madeira. O pé direito do imóvel é bem alto e, sendo assim, a temperatura no verão é fresca e no inverno aconchegante. No caso do Joaquim, as prisões podiam ser consideradas como cadeias de carnaval, pois duravam apenas 1 ou 2 dias. Só para ele dar uma paradinha. Logo que saía voltava às atividades... beber, beber e beber. A cadeia, para o Joaquim, era algo como um pit-stop!

Só que o delegado dessa época não agüentava mais ter de prender o Joaquim praticamente toda semana. E em algumas semanas ele foi preso mais de uma vez. Essa situação não podia continuar, era preciso dar uma lição no “Meia Garrafa”.

Assim, instruiu os policiais que, se fosse necessário prender novamente o tal, não tivessem dó. Ele teria que ser tratado como qualquer outro preso. O Joaquim, freqüentador assíduo da cadeia, era tratado com relativo “carinho”, pois até os policiais gostavam do danadinho.

No final de semana, eis que Joaquim estava fazendo arruaça novamente.

- Liga para o “quatro-oito”! – pediu o dono de um bar no largo do Mercado. Nessa época Tatuí tinha poucos telefones e o da cadeia era o número 48. Em poucos minutos lá estavam os “homens”, para guardar o Joaquim.

Enfiaram rapidamente o pequenino no camburão e levaram até a cadeia. Tiraram o Joaquim do veículo e conduziram até a cela. Desta vez o baixinho estava espirituoso e bramou, com a voz rouca, agressiva e alta:

- Abra a jaula que o leão vai entrar!

Os policiais responderam:

- Ah, é leão? Então vai levar umas “borrachadas”!

Rapidamente Joaquim Meia Garrafa rebateu, já com uma entonação mais “amigável”:

- Peraí! Tem dois tipos de leão: dos manso e dos bravo! Eu sou dos manso!

E a coisa toda virou em gargalhadas.

Esse era o Joaquinzinho Meia Garrafa, um personagem que não existe mais, apesar do senhor Joaquim ainda viver, mas deixou para sempre da bebida e as farras. É um homem muito sério. Sorte dele!
Mas temos aqui um exemplo de ex-bebum. O que ele pode fazer no mundo todo!!!

19) O terrível Tomaizinho das velhas

Tomaizinho foi meu tio-avô. Conversei muito pouco com ele, ou melhor, travávamos apenas um só diálogo desde o casamento de minha tia Neide, em 1960. Nesse casamento, como costuma acontecer, teve lá uns comes e bebes que ele não deixou passar em branco. A festa foi na casa de meu avô Ernestino, ali na esquina da praça do Barão.

Eu estava com meu pai no quintal da casa e encontramos com o Tomaizinho, que foi mexendo com meu pai, dizendo:

- Ô Antoninho das moças!

Não sei o porquê dessa alusão e meu pai nem mesmo ligou, pois o Tomaizinho estava já um tanto alegre. Mas eu, com meus 8 anos de idade, achei ruim! Respondi imediatamente:

- Ô Tomaizinho das velhas!

Ah, se eu soubesse não iria responder assim. Ao invés de ficar aborrecido, ele riu bastante e, desde esse dia, em todas as vezes que o encontrei, ele dizia para mim:

- Antoninho das moças!

Ao que eu respondia:

-Tomaizinho das velhas!

Só isso! E durante cerca de dez anos, até ele falecer, só conversamos isso: “Antoninho das moças” e “Tomaizinho das velhas”.

É muito pouco para uma pessoa que tinha milhares de histórias para contar e, sendo ele mesmo protagonista de situações incríveis.

Tomaizinho era terrível! Para perturbar minha tia Adalgisa, carola, ele dizia que queria ir para o inferno.

O céu, para Tomaizinho, era monótono, com rezas o dia todo

Achava que lá sim deveria ser um lugar gostoso, animado, ao contrário do céu, que na avaliação dele era horrível, cheio de pessoas rezando e com cara ‘comprida’.

No inferno, de acordo com suas suposições, seria uma farra total. Bailes, mulheres, cerveja a vontade, músicas animadas, alegria, risos. Era pra lá que queria ir!

O inferno, segundo Tomaizinho, era festa e bebedeira toda hora

Mas enquanto esteve na Terra, aproveitou como pode... e, quando era Carnaval ele ficava todo assanhado.

Um certo Carnaval vestiu uma fantasia de Dominó e saiu pelas ruas da cidade, para fazer tudo que não dava para fazer com a cara descoberta.

Tomou algumas cervejas geladas, devidamente regadas a “quebra-gelo”, juntou-se a um outro maluco, colocou a fantasia e foi às ruas.

Só que ele mexia com as pessoas e todos falavam:

-Eh Tomaizinho!

Não conseguia ficar incógnito. Mas ele logo percebeu a razão disto.

A máscara cobria toda sua cabeça, na parte da frente descia até seu tórax, mas a parte inferior era um tanto curta. Seu pescoço ficava à mostra.

E que pescoço!

Tomaizinho tinha um pescoço gordo, inconfundível. A máscara ficou curta atrás e deixava aparecer essa parte do corpo. Todos reconheciam imediatamente.
Ele ficou irritadíssimo e exclamou:

- Mardito pescoço!

Mas mesmo assim continuou a andar com a fantasia. Mexia com um, que logo o reconhecia, e repetia:

- Mardito pescoço!

E assim foi durante o dia todo.

Esta outra passagem foi contada pelo Cícero, um de seus filhos:

As compras da tipografia, da livraria e da loja dele eram feitas em São Paulo. Ele, pessoalmente, costumava ir para comprar. Ia, por exemplo, numa terça-feira, saia de madrugada de Tatuí, tomava um trem e logo estava na capital. Passava o resto desse dia, o dia seguinte, quarta-feira e retornava no outro dia, quinta-feira.

As compras eram acompanhadas por festas! Restaurantes, bares, teatros, shows, etc. e tal. Ele podia, tinha dinheiro.

Para ir até a Estação Ferroviária, fazia seu filho levá-lo em seu Ford Prefect. E buscar também. O prazer de Tomaizinho era dizer aos motoristas de carro praça, quando lhes ofereciam o carro:

- Não preciso, eu tenho o meu!

Foto do Ford Prefect

Hoje o carro de praça é chamado de táxi.

Certo dia, Cícero estava indo para a estação, no horário da chegada do trem de São Paulo, para buscar seu pai.

No caminho encontrou com o Dante soldado, policial antigo de Tatuí, que ia apressado para a mesma direção que ele. Parou o carro e perguntou ao Dante:

-Onde vai?

- Estou indo até a Estação - respondeu Dante.

Foto da Estação Ferroviária

- Entre aqui! Eu também estou indo para lá - convidou Cícero.

Dante aceitou, pois estava um tanto atrasado. Naquele tempo a polícia não tinha viaturas como atualmente. E quando tinha, sempre estava com o delegado ou outro superior. Nunca para os policiais. Bem, se a polícia não tinha veículos, os bandidos muito menos. A violência era muito menor. As coisas resolviam-se com facilidade.

Cícero perguntou ao Dante o que ia fazer na Estação e ele respondeu:

- Estou indo até a Estação. Telegrafaram do trem que um arruaceiro que está fazendo das maiores no trem! Vou prendê-lo – disse Dante.

- E você, que vai fazer na Estação? – perguntou Dante ao Cícero.

Vou indo buscar meu pai.

Mas as coincidências sempre acontecem. Quando o trem chegou, perceberam que esperavam o mesmo passageiro. Era o Tomaizinho que tinha exagerado nas cervejas e ficou aborrecido com o fato do Carro Restaurante ter seguido pela linha tronco e durante a viagem de Iperó a Tatuí teve que ficar em um vagão comum. Fez o maior auê no trem!

Ele queria continuar no carro restaurante. É interessante lembrar que os trens vinham com o Carro Restaurante até Iperó, onde havia baldeação para o Ramal de Itararé (Iperó a Itararé). Como o carro restaurante sempre seguia pela linha tronco, e quem vinha para estes lados não tinha onde se alimentar (a não ser com os inúmeros vendedores que entravam nos trens, oferecendo pão com mortadela e biscoitos de polvilho), o trecho ficou conhecido com “Ramal da Fome”, pois quem viajava por aqui não tinha restaurante. Deu tanto azar esse apelido, que a região é a mais pobre do Estado de São Paulo.

Mas voltando aos nossos amigos.

Quando Cícero viu que seu pai era o arruaceiro, preocupou-se.

O Dante já ficou chateado. Imagine, como ele iria prender o Tomaizinho? O homem era importante na sociedade. Prendê-lo seria pedir para ser transferido para as barrancas do rio Paraná.

Resolveram facilmente.
Foto do prédio da Cadeia de Tatuí

Tomaizinho, Cícero e Dante entraram no Prefect, devidamente carregado com as compras feitas em São Paulo, e logo vieram para a cidade.

Todos assistiram o arruaceiro sair com a polícia.

Foram até a casa de Tomaizinho. O Dante ajudou a desembarcar as compras que estavam no carro, tomou um cafezinho, despediu-se e foi embora. Ele não era louco! Imagine... prender Tomaizinho!!!! Eu, hein!!!

domingo, janeiro 22, 2006

18) Juro e Capitár

Não conheci nenhum de meus bisavos. Pouca gente conhece esses seus parentes, como foi meu caso. O protagonista deste causo é o Joaquim dos Santos Silveira, pai de meu avô Ernestino. Quem me contou esta passagem foi o Chico Bento, morador antigo do bairro Jurumirim, homônimo do personagem de Maurício de Souza e que conheceu Joaquim dos Santos.

Joaquim dos Santos tinha audição seletiva. Audição seletiva? Que seria isto?

Bem, alguns achavam que o Joaquim dos Santos era surdo, pois parecia nada escutar. Entretanto, o tal era, na verdade, esperto, pois quando minha bisavó lhe pedia:

- Joaquim, vai buscar água no poço!

Ele logo dizia:

- Não estou escutando nada...!!! e ia saindo de fininho.

Mas se a conversa versasse sobre dinheiro, ele escutava tudo e ainda dava suas opiniões. Também, quando outras coisas o interessassem, certamente escutaria tudo, com todos os detalhes mais importantes.

Na verdade, Joaquim dos Santos, “elegia” aquilo que desejava escutar, selecionando dentre os assuntos que alguém conversasse. Então, sua audição pode ser descrita como seletiva ou eletiva: só participava de conversas que fossem do interesse dele.

Se pensarmos direito, dá para perceber que a maior parte do que se fala bem que poderia ter sido omitido, valorizando o silêncio. Não só o que é falado como o que é escrito... É um grande absurdo a quantidade de palavras que se repetem em cada texto para dar sentido a uma só expressão, a um só assunto...

O sítio onde vivia Joaquim dos Santos ficava perto da Fazenda do Paiol. Não sei quanto tinha “de chão”, mas sei que não era pequeno. A maior parte ficava no bairro Pederneiras. Começava nas Pederneiras e ia até o município de Itapetininga, mas tinha uma parte na Enxovia, que era o local preferido dele para plantar. Hoje teria o rótulo de “fazenda”, pois resolveram distinguir sítio de fazenda apenas pelo tamanho da área. E qual era a distinção dessa época? Não era o tamanho, pois havia muitos sítios com maior área que algumas fazendas.

A distinção entre sítio e fazenda era feita devido ao controle que se dava para cada um dessas denominações. Enquanto que o sítio era algo tratado quase que sem planejamento, condicionado ao tempo, ao “Deus dará”, a fazenda tinha planejamento e controle.

A propriedade de Joaquim dos Santos era tratada com carinho, mas não tinha o controle necessário para classificá-la como fazenda. Produzia, no entanto, para o consumo e para vender o excedente. Tanto que, aos domingos, não se ordenhava com fins comerciais.

Todos os domingos, logo bem cedinho, os vizinhos menos favorecidos iam ao sítio de meu bisavô para ordenhar as vacas e levar para casa o leite. Era o prazer de minha bisavó Maria Rita, ver aquelas pessoas conversando, rindo e tomando todo leite que conseguiam ordenhar.

Mesmo deixando de vender o leite dos domingos, o resultado do trabalho do sítio permitia que meu bisavô tivesse algum dinheiro guardado. Aproveitava e sempre tinha um dinheirinho emprestado a juros. Gostava de ganhar um “jurinho”. Destaquei essa palavra pois em nada se parece com o que se cobra atualmente. As taxas de juros iam de 1% a, quando muito, 1,5%. Um agiota cobrava cerca de 3%!!!

Era morador antigo da região, bastante conhecido e, com isto, ele tinha inúmeros afilhados. Certo dia, um afilhado de batismo veio convidá-lo para ser, agora, seu padrinho de casamento. Acontece que este rapaz havia tomado um dinheiro emprestado de meu bisavô e estava um pouco atrasado com o pagamento dos juros.

Ele veio, conversou com minha bisavó e logo em seguida foi falar com nhô Joaquim:

- Padrinho, eu vou casar daqui uns dias e vim convidá mecê pra ser meu padrinho de casamento!

Joaquim, com sua audição eletiva, foi logo falando:

- Ah, pague só o capitár... Não precisa pagá ‘o juro’!

O rapaz logo foi corrigindo:

Nhô Joaquim, eu vim convidá mecê pra ser padrinho de casamento! Mecê não entendeu direito!

- Não, num precisa pagá ‘o juro’... pague só o capitár mesmo!

Minha bisavó correu para ajudar o afilhado em seu diálogo, tentando explicar direito para o marido o que o rapaz queria.

- Joaquim, não é isso que ele veio conversar!

Mas não adiantou. Meu bisavô ficou bravo e disse:

- Se eu tou falando que não quero receber ‘o juro’, é porque não quero mesmo!

Não houve entendimento. Ele fixou-se na história dos juros e do capital e não conversou mais. O rapaz teve que procurar outro padrinho. Em todo caso, não teve as despesas de apadrinhar o casamento e, pouco tempo depois, acabou recebendo seu capitár.

sábado, janeiro 07, 2006

17) Desastre no Del Fiol

Não se deve usar “desastre” para relatar, por exemplo, um acidente automobilístico. No tempo em que automóveis eram raros no país, acidentes ocorriam com menor freqüência e, então, dizia-se “aconteceu um desastre” com tal automóvel, ou com fulano em seu carro. Mas acidentes automobilísticos, mesmo os piores possíveis, já são considerados como algo comum e corriqueiro, que não comportam a expressão “desastre”. Por extensão, a palavra não pode ser utilizada em incidentes ou eventos corriqueiros, mas para descrever algo catastrófico.

Desastre: calamidade, acidente, desgraça, catástrofe, ruína, sinistro. Estes são apenas alguns dos sinônimos dessa palavra.
Por esse motivo, pelo sentido calamitoso dessa palavra é que o fato aqui registrado pode ser considerado um verdadeiro desastre, como poderá ser constatado adiante.

Neste caso, excepcionalmente, o personagem principal não será identificado, porque todos os acontecimentos deram-se de maneira tal que ele manteve-se no absoluto anonimato. Assim, vamos consagrar este fato ao contar o “causo”.

O “herói” deste caso foi à Praça da Matriz para mais uma sessão filosófica, de conversas fiadas e, com toda certeza, piadas. Ele mesmo não dizia “piadas”, mas “anedotas”... Com sua enorme barriga não tinha muita agilidade. Sendo assim, mesmo residindo nas proximidades da Praça da Matriz, levava algum tempo no trajeto entre sua casa e a praça. Duas quadras, mas uma verdadeira viagem para ele, tamanho o esforço despendido para caminhar estes quase duzentos metros.

Desta vez, porém, foi ao senadinho sem considerar que havia tomado “uns purgantes”. Logo, sem qualquer aviso, começou a sentir, segundo suas próprias palavras, “umas facadas na barriga”. Era o efeito dos purgantes que começava a mandar avisos. Avisos de urgente, urgentíssimo. Praticamente era um “trabalho de parto”... começavam as contrações... o parto não tardava!!!

Aiaiaiaí! E agora? Não dava para voltar. O “neném” viria ao mundo antes de chegar em casa. Que fazer? Bar 80? Bar XV? Nem pensar... impossível encontrar um sanitário “sentável” em qualquer um desses lugares... Bar Central? Avemaria!!!! Quem o conheceu sabe muito bem que para esse tipo de “serviço” não dava... o rio de urina que corria ali dentro impedia qualquer tentativa!

Só restava o Hotel Del Fiol! Assim, “elegeu” o hotel para “trazer à luz” aquilo que avisava estar chegando, chegando com pressa, muita pressa. Um simples “pum” seria suficiente para “por tudo a perder”, no sentido literal dessa expressão.

Suando frio, dirigiu-se para o hotel com a maior velocidade que lhe foi possível, em face às condições daquele momento. A dor era terrível. Mulheres costumam dizer que homem não conhece o que é dor, pois não têm que parir seus filhos. A participação masculina é só na concepção. Depois disso, a coisa toda corre por conta das mães. Mas a dor daquele momento aproximava-se disso. As contrações tinham apenas alguns segundos de intervalo, uns momentos que aproveitava para respirar...

Entrou no hotel rapidamente, dirigindo-se para os fundos, no final de um corredor, onde havia um sanitário que geralmente ficava com as portas abertas, pois era utilizado pelos clientes que apenas freqüentavam o bar ou o restaurante do hotel.

O lay-out do hotel era muito diferente do atual. Havia, no primeiro bloco, um corredor central, os aposentos dos proprietários do lado direito e o bar e restaurante do lado esquerdo, formando um “L” nos fundos. Os quartos e apartamentos ficavam mais ao fundo, logo depois desse primeiro bloco.

Os tempos também eram outros, não havia guardas. Somente tinha o Vicente, que fazia um pouco de tudo: atendia aos hóspedes, aos clientes do bar e do restaurante.. Tudo, enfim, ele fazia tudo. Mas quando o Vicente não estava no balcão, quando saía uns minutos, nem precisava ter alguém por lá. Quem iria mexer em alguma coisa por lá? Ninguém! Hoje pode ter grades, guardas, seguranças, câmeras, etc., mas não há segurança para ninguém.

Com isto, entrou no hotel e não foi visto, mesmo porque não tinha ninguém pela entrada naquele momento. E depois, ele andava rápido como um raio! E o som do trovão “rugia” nos seus intestinos.

Quando há chuva com raios e trovões todos ficam assustados, principalmente as crianças. Para acalmá-las dizem que aquele barulhão todo é por que estão lavando os céus e que uns armários sendo empurrados... Bruuuuuuuuummmmm!!!

Ali, com nosso “herói”, a coisa fazia muito barulho também e aconteceria uma limpeza equivalente em todos os sentidos: Bruuuuuuuuummmmm!!! Só que o que estava sendo empurrado não era nenhum armário do céu.


Chegou, enfim, ao seu destino. Ou melhor, ao local onde daria destino final aos resíduos alimentares processados em seu aparelho digestivo. Eliminar o resultado de um processamento mais rápido, decorrente do efeito do purgante e que tinha pressa, exagerada pressa em finalizar as atividades internas, passando dos avisos para a ação propriamente dita.

Entrou sem fechar a porta com o trinco, seu cinto já estava aberto e desabotoava freneticamente os botões da braguilha: levou uma eternidade, ultrapassou o tempo em uns poucos segundos, mas o suficiente para espirrar meleca para todo canto... na parede, no chão, do lado de fora do vaso. Quando foi possível sentar, terminou de esvaziar-se no local adequado.

“Que alívio!” - a sensação de “dever cumprido” invadia sua alma!!!

- Assim que terminar o serviço eu dou uma lavada nisto tudo! – pensou nosso herói. Mas ao abrir a torneira da pia, aquela decepção: - Mardito Tatuí, não tem água! – exclamou em voz alta.

Fez uma tentativa com papel higiênico, mas tudo que conseguiu foi espalhar aquela coisa horrorosa e fedorenta pela parede, empestando os azulejos. E o chão, e tudo por ali... até em sua perna escorreu um pouco, que não conseguiu limpar. Tinha a impressão que até no teto havia mérda!

Só lhe restava uma saída: bater em retirada! E rápido!

Se isto não era uma alternativa honrosa, ficar por ali seria pior, muito pior... como explicar aquilo tudo? Não iriam acreditar, todos ficariam imaginando que ele havia jogado propositadamente com a mão.

Sorrateiramente saiu dali, estava mais ágil naquele momento, pesando uns 2 quilos a menos e sem aquela imensa pressão dentro de seu ventre.

Enquanto deslizava pelo corredor, escutou a Rita, funcionária antiga do hotel, cantando alegremente: “...O que é que a baiana tem... trá-lá-lá-lá..." Ele só queria sair incógnito e pensou: “Você já vai ver o que é que a baiana tem!!!”

Ninguém o viu saindo, mas quando chegou à porta de saída, já na rua, ele escutou a Rita gritando: - O QUE QUE É ISTO? QUE HORROOORR!!!! Seu Osvárdo do céu, venha ver o que fizeram aqui!!!

Todos os outros afazeres no hotel foram suspensos naquele dia e todos os funcionários deram duro para conseguir limpar a desgraça que ficou por lá... Resumindo todo o acontecimento em poucas palavras: uns segundos de atraso, poucos minutos de “obra” e três horas e meia para limpar.

E nosso amigo? Foi embora tomar um banho e trocar a roupa que estava toda melecada. Desastre total!