sábado, janeiro 07, 2006

17) Desastre no Del Fiol

Não se deve usar “desastre” para relatar, por exemplo, um acidente automobilístico. No tempo em que automóveis eram raros no país, acidentes ocorriam com menor freqüência e, então, dizia-se “aconteceu um desastre” com tal automóvel, ou com fulano em seu carro. Mas acidentes automobilísticos, mesmo os piores possíveis, já são considerados como algo comum e corriqueiro, que não comportam a expressão “desastre”. Por extensão, a palavra não pode ser utilizada em incidentes ou eventos corriqueiros, mas para descrever algo catastrófico.

Desastre: calamidade, acidente, desgraça, catástrofe, ruína, sinistro. Estes são apenas alguns dos sinônimos dessa palavra.
Por esse motivo, pelo sentido calamitoso dessa palavra é que o fato aqui registrado pode ser considerado um verdadeiro desastre, como poderá ser constatado adiante.

Neste caso, excepcionalmente, o personagem principal não será identificado, porque todos os acontecimentos deram-se de maneira tal que ele manteve-se no absoluto anonimato. Assim, vamos consagrar este fato ao contar o “causo”.

O “herói” deste caso foi à Praça da Matriz para mais uma sessão filosófica, de conversas fiadas e, com toda certeza, piadas. Ele mesmo não dizia “piadas”, mas “anedotas”... Com sua enorme barriga não tinha muita agilidade. Sendo assim, mesmo residindo nas proximidades da Praça da Matriz, levava algum tempo no trajeto entre sua casa e a praça. Duas quadras, mas uma verdadeira viagem para ele, tamanho o esforço despendido para caminhar estes quase duzentos metros.

Desta vez, porém, foi ao senadinho sem considerar que havia tomado “uns purgantes”. Logo, sem qualquer aviso, começou a sentir, segundo suas próprias palavras, “umas facadas na barriga”. Era o efeito dos purgantes que começava a mandar avisos. Avisos de urgente, urgentíssimo. Praticamente era um “trabalho de parto”... começavam as contrações... o parto não tardava!!!

Aiaiaiaí! E agora? Não dava para voltar. O “neném” viria ao mundo antes de chegar em casa. Que fazer? Bar 80? Bar XV? Nem pensar... impossível encontrar um sanitário “sentável” em qualquer um desses lugares... Bar Central? Avemaria!!!! Quem o conheceu sabe muito bem que para esse tipo de “serviço” não dava... o rio de urina que corria ali dentro impedia qualquer tentativa!

Só restava o Hotel Del Fiol! Assim, “elegeu” o hotel para “trazer à luz” aquilo que avisava estar chegando, chegando com pressa, muita pressa. Um simples “pum” seria suficiente para “por tudo a perder”, no sentido literal dessa expressão.

Suando frio, dirigiu-se para o hotel com a maior velocidade que lhe foi possível, em face às condições daquele momento. A dor era terrível. Mulheres costumam dizer que homem não conhece o que é dor, pois não têm que parir seus filhos. A participação masculina é só na concepção. Depois disso, a coisa toda corre por conta das mães. Mas a dor daquele momento aproximava-se disso. As contrações tinham apenas alguns segundos de intervalo, uns momentos que aproveitava para respirar...

Entrou no hotel rapidamente, dirigindo-se para os fundos, no final de um corredor, onde havia um sanitário que geralmente ficava com as portas abertas, pois era utilizado pelos clientes que apenas freqüentavam o bar ou o restaurante do hotel.

O lay-out do hotel era muito diferente do atual. Havia, no primeiro bloco, um corredor central, os aposentos dos proprietários do lado direito e o bar e restaurante do lado esquerdo, formando um “L” nos fundos. Os quartos e apartamentos ficavam mais ao fundo, logo depois desse primeiro bloco.

Os tempos também eram outros, não havia guardas. Somente tinha o Vicente, que fazia um pouco de tudo: atendia aos hóspedes, aos clientes do bar e do restaurante.. Tudo, enfim, ele fazia tudo. Mas quando o Vicente não estava no balcão, quando saía uns minutos, nem precisava ter alguém por lá. Quem iria mexer em alguma coisa por lá? Ninguém! Hoje pode ter grades, guardas, seguranças, câmeras, etc., mas não há segurança para ninguém.

Com isto, entrou no hotel e não foi visto, mesmo porque não tinha ninguém pela entrada naquele momento. E depois, ele andava rápido como um raio! E o som do trovão “rugia” nos seus intestinos.

Quando há chuva com raios e trovões todos ficam assustados, principalmente as crianças. Para acalmá-las dizem que aquele barulhão todo é por que estão lavando os céus e que uns armários sendo empurrados... Bruuuuuuuuummmmm!!!

Ali, com nosso “herói”, a coisa fazia muito barulho também e aconteceria uma limpeza equivalente em todos os sentidos: Bruuuuuuuuummmmm!!! Só que o que estava sendo empurrado não era nenhum armário do céu.


Chegou, enfim, ao seu destino. Ou melhor, ao local onde daria destino final aos resíduos alimentares processados em seu aparelho digestivo. Eliminar o resultado de um processamento mais rápido, decorrente do efeito do purgante e que tinha pressa, exagerada pressa em finalizar as atividades internas, passando dos avisos para a ação propriamente dita.

Entrou sem fechar a porta com o trinco, seu cinto já estava aberto e desabotoava freneticamente os botões da braguilha: levou uma eternidade, ultrapassou o tempo em uns poucos segundos, mas o suficiente para espirrar meleca para todo canto... na parede, no chão, do lado de fora do vaso. Quando foi possível sentar, terminou de esvaziar-se no local adequado.

“Que alívio!” - a sensação de “dever cumprido” invadia sua alma!!!

- Assim que terminar o serviço eu dou uma lavada nisto tudo! – pensou nosso herói. Mas ao abrir a torneira da pia, aquela decepção: - Mardito Tatuí, não tem água! – exclamou em voz alta.

Fez uma tentativa com papel higiênico, mas tudo que conseguiu foi espalhar aquela coisa horrorosa e fedorenta pela parede, empestando os azulejos. E o chão, e tudo por ali... até em sua perna escorreu um pouco, que não conseguiu limpar. Tinha a impressão que até no teto havia mérda!

Só lhe restava uma saída: bater em retirada! E rápido!

Se isto não era uma alternativa honrosa, ficar por ali seria pior, muito pior... como explicar aquilo tudo? Não iriam acreditar, todos ficariam imaginando que ele havia jogado propositadamente com a mão.

Sorrateiramente saiu dali, estava mais ágil naquele momento, pesando uns 2 quilos a menos e sem aquela imensa pressão dentro de seu ventre.

Enquanto deslizava pelo corredor, escutou a Rita, funcionária antiga do hotel, cantando alegremente: “...O que é que a baiana tem... trá-lá-lá-lá..." Ele só queria sair incógnito e pensou: “Você já vai ver o que é que a baiana tem!!!”

Ninguém o viu saindo, mas quando chegou à porta de saída, já na rua, ele escutou a Rita gritando: - O QUE QUE É ISTO? QUE HORROOORR!!!! Seu Osvárdo do céu, venha ver o que fizeram aqui!!!

Todos os outros afazeres no hotel foram suspensos naquele dia e todos os funcionários deram duro para conseguir limpar a desgraça que ficou por lá... Resumindo todo o acontecimento em poucas palavras: uns segundos de atraso, poucos minutos de “obra” e três horas e meia para limpar.

E nosso amigo? Foi embora tomar um banho e trocar a roupa que estava toda melecada. Desastre total!

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