segunda-feira, fevereiro 08, 2010

83) Tudo com a maior higiene

Certa vez, Edgar Vieira e Elias Sallum foram pescar no rio Paranapanema com seus filhos João Augusto e Eliazinho. Na hora do almoço foram numa espécie de bar e restaurante que ficava na beira do rio. O cozinheiro que limpava os peixes para fritar tinha uma pequena ferida no rosto.

Edgar viu que o homem coçava ao redor da ferida com a ponta da mesma faca que cortava os peixes e avisou Elias. Quando se levantavam para sair, notaram que os meninos estavam com fome. Levaram em consideração que havia uma bela salada para eles comerem. As verduras, lavadas, estavam em uma bacia e tinham ótima aparência.

- Vai dar para tapear o estômago! – comentou com Elias.

Até a rainha da Inglaterra cotuca o nariz, de vez em quando!

Nisso entrou a mulher do cozinheiro que, caminhando, se assoou ruidosamente com as mãos: Prrrrr! Parecia uma buzina. Com um movimento rápido de mão e dedos, lançou ao chão a meleca que saiu do nariz. Quando a danada mulher aproximou-se da bacia com as verduras, foi logo enfiando as mãos sujas na bacia e, remexendo os vegetais, disse, com uma pronúncia esquisita devido à coriza que ainda escorria do nariz:

- Que “selada” coisa mais linda! Que beleza de “selada”!

Depois disso não deu mais para ficar. Arrumaram uma desculpa qualquer e foram embora sem comer. Na estrada, o ruído dos estômagos do João Augusto e do Eliazinho encobria o ronco do DKW do Elias Sallum.

O pior de tudo é que esse comportamento anti-higiênico não é incomum: Quando vendia o loteamento Colina Verde, Zé Turco estabeleceu seu escritório no antigo posto de gasolina do seu Chiquinho Del Fiol, ali na esquina da Praça da Matriz.

Durante o dia todo, ele atendia no escritório do posto e, no final da tarde, costumava curtir a “happy hour” no bar que existia no local onde hoje estão as lojas “Toda Mulher” e a “Ótica Visão” O correto deveria ser “many happy hours”, pois os aperitivos, as comidinhas e os bate-papos começavam antes do final do expediente e estendiam-se até bem tarde.

Ah, como eram alegres essas horas felizes!! Sentados em frente à Praça da Matriz, os encontros diários do Zé Turco com seus amigos eram um misto de riso e cerveja, salgadinhos e cerveja, porções de queijo e cerveja, mortadela e cerveja, salame e cerveja, conversa e cerveja, azeitonas e cerveja, cerveja e cerveja...

O barman chamava-se Acácio e estava sempre preparado para atender esse pessoal. Costumava deixar bem afiada uma faca grande com a qual cortava os queijos e os frios exatamente do jeito que o Zé Turco apreciava. Pudera, sempre que fechava um negócio ele caprichava nas gorjetas. Resta lembrar que não se fechava um negócio na cidade sem que tivesse uma participação desse grande corretor e, por isso, as gorjetas eram consideráveis.

Uma tarde, depois de concretizar uma venda, a “happy hour” começou mais cedo. Desde 3 da tarde. Cervejas, queijos, salames, salgadinhos... O barman esforçava-se ao máximo para dar conta dos pedidos e, quando tinha uns momentos de folga, encostado do lado de dentro do balcão, inclinava-se um pouco. Erguia-se apenas para cortar mais porções aos insaciáveis e alegres amigos.

Entretanto, tomar cerveja tem um efeito colateral: é preciso descarregar o excesso de líquido de vez em quando. Quando retornava de uma das inúmeras “viagens” que fez ao sanitário, Zé Turco deu uma olhadela do outro lado do balcão, intrigado com as abaixadas do barman. Aiaiai, antes não tivesse visto!

Na mesma hora saiu fora do bar, vomitando. Olhou para os amigos, mas não conseguiu falar nada, pois lançava fora tudo que havia ingerido. Em seguida, saiu rapidamente, quase correndo, e foi embora para casa.

Aquele seu comportamento deixou todos preocupados. Rampim, na mesma hora, correu até a casa do amigo, pensando que teria de chamar uma ambulância para levá-lo ao hospital. Serginho Nhô Bau ficou tão nervoso que quase teve um treco. Até Euchário Holtz, que não tinha muita mobilidade, saiu rapidamente para tentar acudir ao Zé Turco... Em minutos o alcançaram, já refeito do mal estar.

- Que aconteceu? – perguntou, alarmado, Rampim.

- É... que aconteceu? Quer ir ao médico? – completou Euchário.

Ainda um pouco pálido, Zé Turco, olhando por cima dos óculos, disse aos amigos:

- Imaginem só o que o Acácio fazia quando se abaixava dentro do balcão! – falou com uma entonação grave e uma cara de nojo. - O lazarento estava raspando o “queijo” do pé com a mesma faca que cortava os frios que servia pra nós! – explicou, furioso.

Acácio substituiu as ferramentas de pedicure pela faca de cortar frios!

-Éca! Ptu! Éca! Ptu! Mardição! Éca! O cospe-cospe dos amigos foi terrível. Claro que nunca mais voltaram àquele bar. Éca!

Um comentário:

Anônimo disse...

Oi Fran
Que maravilhoso conhecer um pouco das memórias do meu pai. Obrigado de me proporcionar esse contato com as suas histórias cotidianas, seu convívio com os amigos e com o inseparável Zé Turco.
Você pode me enviar os links de todas as histórias em que ele aparece ?
Tenha certeza... muitas pessoas ficam agradecidas com esse contato mágico com o passado. é como matar um pouco as saudades dos que se foram.....
abraços
Sônia
soniaflorencio@iphan.gov.br