domingo, outubro 11, 2009

79) Ouro de enterro

Há muitas histórias a respeito de tesouro enterrado por todo o mundo. Em Tatuí a coisa não poderia ser diferente. Aqui e ali contam casos de fortunas enterradas, geralmente próximas de alguma árvore, que serve para marcar o lugar. O ponto em comum desses casos é a existência de um guardião sinistro: uma alma do outro mundo.

Histórias sobre tesouros guardados por fantasmas são comuns

O guardião é o fantasma do proprietário do tesouro enterrado. Geralmente uma pessoa avarenta e ambiciosa em vida, que passou inúmeras privações só para acumular fortuna. Em sua vida, viu e desejou comida e objetos, mas deixou de tê-los para não gastar e, assim, guardar seu rico dinheirinho. Como não gastou durante sua vida, foi acumulando, acumulando até que, um dia, surgiram temores de ser assaltado e que toda sua fortuna desaparecesse. Que fazer? Esconder, claro! Eis a explicação para esses “enterros”. O Ivan Camargo, em seu livro sobre as assombrações caipiras, fala desse assunto. Eu, particularmente, conheço alguns “caçadores de ouro de enterro” e como o assunto está em voga, conto aqui alguns acontecimentos relativamente recentes.

Um desses caçadores é o Silvio Soldado, policial aposentado que garante ter encontrado fortunas enterradas. Meu amigo Inocencinho, um bravo e valente pedreiro, é outro famoso caçador de enterros. Tem um braço atrofiado de nascença, mas que nunca impediu de trabalhar pesado ou de enfrentar qualquer homem em uma briga. Hoje, mesmo estando bem idoso, não desistiu de encontrar um enterro que lhe assegure alguma fortuna. Durantes anos procurou em diversos lugares. Sempre que teve notícia de um local que alguém diz ser “mal assombrado”, Inocêncio já tentava encontrar uma maneira de ir lá e esburacar os arredores...

Sabendo que no sítio do Hélio “Anacleto” Camargo Barros havia uma paineira com fama de ser mal assombrada, Inocêncio me procurou para que eu intercedesse junto ao proprietário, também meu amigo, para obter autorização para ele buscar o ouro que, garantiu, estava enterrado lá.

- Eu comprei um parêio que acha quarquér metár! – disse-me o Inocêncio, explicando que tinha um equipamento apropriado para identificar metais enterrados.

- E de ‘sombração num tenho medo! Num tenho medo nem de morto e nem de vivo! – valente como é, fez questão de afirmar. Ele queria ir caçar o tesouro enterrado no sítio dos Camargo Barros junto com o Santo Galvão, seu vizinho. Mas se o Inocêncio não temia nem vivos e nem mortos, não era o mesmo caso do Santo. Quando indaguei se ele também ia procurar o enterro, ouvi como resposta:

- Iiih, “capaiz”! – disse o Santo. – Eu é que num vô mexê cum árma d’otro mundo! – completou. E com isto, não foram mesmo. Nem o Inocêncio e nem o Santo. Um por falta de companhia e o outro por medo.

Mas o boato do ouro de enterro naquele local já tinha chegado a outros ouvidos. Muita gente procurava o Anacleto para tentar uma autorização visando encontrar o ouro enterrado. Um belo dia, enjoado de tanta gente abordá-lo com o mesmo assunto, Anacleto resolveu permitir a busca do tal tesouro em sua propriedade. Permitiu que o Francis Pássaro e seu amigo Clovinho Lima desenterrassem o tal tesouro.

Faltou pouco para chegarem na China!

Ah, que ânimo desses caçadores de tesouro! Se todos tivessem a mesma disposição dessa dupla para cavar, o mundo já teria túneis que chegariam até a China! Os dois passaram uma semana em atividade ao redor da tal paineira. Nesses poucos dias fizeram um buraco enorme, circundando a árvore. Movimentaram centenas de metros cúbicos de terra, contando só com pás, picaretas, enxadões e enxadas...

O buraco que cavaram media uns 25 metros de diâmetro por 3 metros de profundidade, o que representa um horror de metros cúbicos de terra remexida, o que dá para encher mais de algumas dezenas caminhões basculantes!!! A terra removida, amontoada na borda do buraco, além da profundidade da escavação, permitiu que trabalhassem a maior parte do tempo na sombra quase que o dia todo. Só por volta do meio dia o sol iluminava o buraco sem fazer sombra.

Os dois caçadores tinham a impressão que iam encontrar muito ouro

Entretanto, apesar da persistência da dupla, não encontraram nem um tostão furado. Nada de ouro, prata, pedras preciosas ou qualquer metal. Tinha sim muita terra, que úmida do suor despendido na trabalhosa empreitada, formou lama que cobriu os caçadores de tesouro, deixando os dois mais parecidos com assombrações do que pessoas.